Promotor diz que outras empresas de ônibus de SP são investigadas e podem precisar de intervenção da prefeitura


10/04/2024 - G1 SP e Globo News São Paulo


Promotor diz que outras empresas de ônibus de SP são investigadas e podem precisar de intervenção da prefeitura

Lincoln Gakiya orienta gestão Ricardo Nunes (MDB) a romper os contratos com as empresas Transwolff e UPBus, alvos da operação desta segunda (9) por suspeita de ligação com o PCC. Segundo as investigações, as duas receberam mais de R$ 800 milhões da Prefeitura de SP em 2023.


O promotor de Justiça Lincoln Gakiya, do Ministério Público de São Paulo, coordenador da operação ‘Ponto Final'. — Foto: Reprodução/TV Globo


O promotor de Justiça Lincoln Gakiya, do Ministério Público de São Paulo, afirmou nesta segunda-feira (9) que outras empresas além da Transwolff e da UPBus são investigadas na capital paulista por suspeita de ligação com organizações criminosas.

Gakiya é responsável no Grupo de Atuação Especial ao Crime Organiza (Gaeco) pela operação ‘Ponto Final’, que prendeu quatro pessoas dirigentes de empresas concessionárias de ônibus da capital paulista, após denúncias de elo com o facção Primeiro Comandado da Capital (PCC).

Segundo o promotor, o Departamento de Investigações Sobre o Crime Organizado (DEIC), da Polícia Civil, já investiga outras empresas de transporte coletivo da cidade, com apoio do MP.

“Há outras investigações no DEIC e na Polícia Civil [contra outras empresas] com participação nossa do MP. Se chegar ao mesmo resultado, vocês podem ter certeza que a medida a ser proposta vai ser a mesma [intervenção]. É que depende de quebra de sigilo bancário e fiscal. Não é fácil também achar as empresas [participantes do esquema]. O que nós apreendemos hoje talvez rendam outras investigações”, afirmou.

Operação mira empresas de ônibus de SP acusadas de lavagem de dinheiro do PCC

Por conta da operação 'Fim da Linha' nesta segunda (10), a Prefeitura de SP foi obrigada pela Justiça a assumir a operação das empresas Transwolff e da UPBus, que responsáveis por linhas de ônibus da Zona Sul e Zona Leste.


O prefeito Ricardo Nunes (MDB) nomeou dois servidores de carreira da SPTrans como interventores nas duas empresas, a fim de garantir a continuidade na prestação do serviço de transporte público nessas duas regiões e não prejudicar os passageiros.

Porém, Lincoln Gakiya afirma que a gestão municipal já precisam pensar em romper os contratos e realizar uma nova licitação nos lotes operados por elas na cidade.

“Se não houver solução e haver realmente uma contaminação na empresa é preciso romper o contrato e colocar uma empresa lícita naquele setor, através de uma nova licitação. Não tem que esperar. A decisão judicial era para a intervenção. A Prefeitura de SP podia ter dois caminhos: um era se opor à intervenção e recorrer. Ela poderia ter optado por apoiar a medida ou contestar a medida”, disse.

“O prefeito deixou bem claro que já baixou os dois decretos e vai apoiar a medida [de intervenção. Então, a partir desses dois modelos, é possível que prefeitura possa instaurar procedimentos contra as demais se houver compartilhamento [com esquemas ilícitos]”, declarou ao g1.

Dirigentes de empresas de ônibus em São Paulo são presos suspeitos de lavar dinheiro para o tráfico de drogas

Financiamento de políticos

Em entrevista à GloboNews, Lincoln Gakiya também disse que o Gaeco investiga o financiamento do PCC a campanhas políticas no estado de SP, para aumentar o poder de influência do grupo criminoso.

“A operação continua. Eu acho que existe, sim, essa suspeita, inclusive do crime organizado financiar algumas campanhas eleitorais, e quando eu falo financiar, eu falo sobretudo realmente nos municípios né? Às vezes as pessoas se preocupam muito com a campanha, por exemplo, no Congresso Nacional, mas ali o crime, mesmo que conseguir eleger, um deputado, um senador, seria uma pessoa só. Mas onde eles conseguem os seus negócios, conseguem a liberação de hotéis, empreendimentos e de outros comércios, é no município”, declarou (veja vídeo abaixo).

“Existe suspeita do crime organizado financiar algumas campanhas eleitorais em municípios de SP”, diz promotor

“Não é incomum, de nós verificarmos realmente, financiamento a campanha de prefeitos, financiamento a campanha de vereadores, a investigação prosseguirá, sim, porque há outras empresas nesse ramo de negócio, que estão sendo investigadas, inclusive pela Polícia Civil aqui de SP, com o acompanhamento aqui do MP e do GAECO, que eu estou coordenando essa força tarefa, então a gente vai prosseguir e se chegarmos não só nessas questões de políticos envolvidos, ou mesmo de servidores públicos que pudessem ter de alguma maneira, participado pra que essas empresas tenham ganho essas licitações, também a gente vai partir pra punição desses servidores e políticos”, afirmou.

Transwolff e UPBus

Investigação mostra ligação de empresas de ônibus da capital com o crime organizado; prefeitura assume Transwolff e UPBus

De acordo com o MP, as empresas de ônibus Transwolff e UPBus, que operam respectivamente nas zonas Sul e Leste da capital paulista, receberam em 2023 mais de R$ 800 milhões da Prefeitura de São Paulo.

Dirigentes de ambas são suspeitos de ligação com a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). Na operação desta segunda (9) dois dirigentes e um representante da Transwolff foram presos. Um dirigente da UPBus está foragido.


As empresas Transwolff e UPBus, alvos nesta terça-feira (9), de operação do Ministério Público de SP. — Foto: Acervo Pessoa/Divulgação


Com 13 linhas e 138 veículos operando na cidade, a UPBus recebeu R$ 81 milhões da SPTrans em 2023, contra R$748 milhões da Tanswolff, que opera 100 linhas na Zona Sul de SP e tem mais de 1.100 veículos circulando na capital paulista, de acordo com os promotores.

Na avaliação do MP, o crime organizado tomou grandes proporções no país. A operação teve como objetivo estrangular a ação do PCC dentro da gestão pública, e provocar prejuízo financeiro da facção.

“O que nos preocupa é que a organização está tomando tamanho de máfia, se infiltrando no estado, participando de licitações de estado. Isso é característico de máfias, como a gente já viu na Itália. (…) E essa operação está atuando na asfixia financeira desse grupo”, aponta o promotor Lincoln Gakiya.


Números de atuação da Transwolff e da UPBus na cidade de Sâo Paulo. — Foto: Reprodução/TV Globo


Foram presos na operação:

Luiz Carlos Efigênio Pacheco, conhecido como "Pandora", dono da Transwolff. Ele foi preso dentro de casa.

Robson Flares Lopes Pontes, dirigente da Transwolff. Ele foi preso na garagem da Transwolff.

Joelson Santos da Silva, sócio e representante legal de um escritório contabilidade que, segundo o MP, dava suporte ao esquema da Transwolff. Não foi informado onde ele foi achado.

Elio Rodrigues dos Santos. Não era dirigente de nenhuma empresa e não era alvo da operação, mas foi preso em flagrante por porte ilegal de arma em um dos endereços onde foram feitas buscas.

MP faz operação para prender dirigentes de empresas de ônibus de SP

Está foragido:

Silvio Luis Ferreira, o "Cebola", sócio da UPBus.

Ao todo, foram cumpridos 52 mandados de busca e apreensão na operação. As ações ocorreram na capital, Grande São Paulo e em cidades do interior paulista.

No imóvel de um de Luiz Carlos Efigênio Pacheco, dono da Transwolff, foram encontrados diversos fuzis, revólveres, além de dinheiro e joias.

Intervenção

Por conta da ação, a Prefeitura de SP passa a assumir o controle as linhas que eram operadas pelas empresas.

Prefeito Nunes disse que já nomeou os dois interventores que atuarão na gestão das duas empresas alvo da operação 'Fim da Linha'. São dois servidores de carreira da SPTrans: Valdemar Gomes de Mello e Wagner Chagas Alves (diretor de operações da empresa).

“Já fiz o decreto publicado hoje no Diário Oficial onde determino a intervenção na Transwolff e na UPBus. Quero contar com a colaboração da imprensa para deixar claro que não haverá nenhuma paralisação no transporte público municipal por parte dessas empresas. Fornecedores não deixarão de receber. Os interventores já estão lá nas duas empresas. Não haverá demissão de funcionários. Só muda a gestão dessas empresas”.


Armamento encontrado na casa de dirigente de empresa de ônibus de SP, alvo de operação do MP — Foto: Divulgação/MP

Bloqueio de bens e afastamento de cargos

As decisões judiciais estabelecem também o bloqueio de bens dos investigados, no valor máximo de quase R$ 600 milhões.

Os dirigentes das empresas devem se afastar dos cargos, e cinco deles, ligados à UPBus, terão de cumprir medidas cautelares - entre elas, a proibição de frequentar a empresa e de se ausentar da cidade sem comunicação prévia à Justiça.

A operação é realizada pela polícia Militar, pela Receita Federal e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade, órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública que fiscaliza e combate abusos de poder econômico.


Armas encontradas em casa de dono de empresa de ônibus de SP — Foto: Divulgação/MP

Empresas usadas para lavar dinheiro do tráfico

Durante quase cinco anos de investigação, os promotores do grupo de combate ao crime organizado (Gaeco) reuniram indícios de que as empresas eram usadas pela facção criminosa para lavar dinheiro do tráfico de drogas e de outros crimes.

A suspeitas de que o crime organizado estava infiltrado no transporte público de São Paulo vêm desde os anos 1990, quando parte do sistema era operado por perueiros clandestinos, que faziam o trajeto entre os bairros mais afastados e os terminais de ônibus.

Em 2003, a prefeitura da capital transferiu a operação das linhas para a iniciativa privada. Parte do sistema ficou com as grandes empresas de ônibus, e os itinerários mais curtos passaram a ser feitos por cooperativas. A maior delas era a Cooperpam, com sede na Zona Sul.

Ao longo dos anos, segundo o MP, os dirigentes dessa cooperativa montaram uma empresa e passaram a pressionar e até ameaçar os cooperados para que transferissem o controle da cooperativa para essa outra companhia, chamada de TW ou Transwolff.

Além disso, segundo os promotores, os diretores se apropriavam de parte da remuneração dos cooperados.

Dez anos depois, em 2013, quando o primeiro contrato de permissão da Prefeitura de SP chegou ao fim para todas as empresas, a Transwolff conseguiu assinar um contrato emergencial, que foi prorrogado durante anos, devido a um impasse no processo de concessão.


Joias e relógios encontrados pela polícia em residência de dono de empresa de ônibus da capital paulista — Foto: Divulgação/MP

Diretor de empresa na cúpula do PCC

Só em 2019, depois que o TCM liberou a licitação, a prefeitura da capital assinou 32 contratos para a concessão das linhas de ônibus da cidade, por um prazo de 15 anos.

No caso da UPBus, o Ministério Público afirma que os diretores integram a cúpula da facção criminosa. Um dos donos da empresa era Anselmo Bicheli Santa Fausta, conhecido como “Cara Preta”.

Anselmo foi assassinado e degolado em dezembro de 2021. A cabeça dele foi deixada em uma praça do Tatuapé, também na Zona Leste.

Os promotores descobriram que outros chefes da facção criminosa fazem parte da direção da UPBus. Dois deles aparecem entre os sócios: Alexandre Salles Brito, chamado de Buiú, e Claudio Marcos de Almeida, o Jango. Eles já foram alvos de investigação por crimes graves como homicídios, tráfico de drogas, sequestros e roubo a bancos.

Parentes dos investigados também entraram para a sociedade. Segundo a investigação, eles têm profissões ou exercem atividades econômicas incompatíveis com o capital investido na UPBus.

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